A PEQUENA HISTÓRIO DE GIUSEPPE PEGORARO E SUA FILHA MARIA
(Ivan Pegoraro)
Vapor Solferino |
Convés do Navio com os Imigrantes 45 dias no mar |
Citadella é uma pequena comuna italiana com cerca de
18000 habitantes e está situada na região de Vêneto, província de Pádua, na
Itália. Foi fundada em 1220 DC e possui ainda hoje uma muralha de 1,5 km
espetacularmente conservada e que teve a finalidade de proteger seus moradores
contra os ataques das cidades de Treviso e Vicenza. A Itália naquela época não
estava unificada e era composta por reinos. Foi envolvido por essas
fortes muralhas que Giuseppe Antonio Pegoraro nasceu em 23 de Maio de 1867 e
ainda muito jovem, com 24 anos se tornou viúvo de forma súbita, sua esposa
sendo atacada por doenças que eram impossíveis de curar naquela época. Ao seu
lado, com toda a responsabilidade para criar, educar, manter e proteger, sua
única filha Maria Pegoraro, com pouca idade, contando com apenas dois anos.
Ainda um bebê. Certo dia, caminhando pelas vielas de sua pequena comuna, que
naquela época não tinha mais do que seis ou sete mil habitantes, Giuseppe
conversou com alguns amigos que relataram a grande aventura que alguns
conterrâneos já tinham iniciado na busca de novos ares, longe dali, em outro
continente. Relataram a ele que o Brasil estava em franco desenvolvimento com a
República declarada e muitas frentes de trabalho, principalmente no campo e
fazendas. Falaram que havia muita fartura e que um mês de trabalho cobriria um
ano de mantimentos. A Escravidão tinha sido abolida, e o país carecia de
mão-de-obra. Numerosos italianos estavam imigrando dado inclusive a facilidade
na tramitação dos papéis e o incentivo do governo brasileiro em busca dessa mão
de obra. Houve na Itália um investimento pesado em propaganda pró-imigração.
Divulgava-se que no Brasil os camponeses teriam trabalho e seriam donos de suas
terras, não mais dependeriam dos “Signori”. Cerca de cinco milhões de italianos
deixaram seu país entre 1875 e 1920, e se dirigiram a diversos países, dentre
eles, especialmente o Brasil. Giuseppe se interessou e
pensativo passou a noite sem dormir, enquanto olhava com tristeza o pequeno
cômodo onde residia. Sentou-se aos pés da cama onde Maria dormia e chorou de
saudade de sua esposa, seu esteio, sua fortificação e que havia lhes deixado
tão jovem e de forma tão inesperada. No dia seguinte, logo de manhã, sonado
pela noite mal dormida procurou a Prefeitura de Citadella e buscou informações
a respeito desta ideia de mudar de país. No almoço, avisou Maria que
iriam se mudar para o Brasil. A pequena não entendeu a dimensão
daquela informação e continuou a brincar com os parcos brinquedos de madeira
que possuía. Giuseppe, pôs-se a preparar a documentação e com suas poucas
economias e com as passagens concedidas pelo governo brasileiro, conseguiu
obter duas passagens, para si e sua filha, de 3ª Classe num navio a
vapor de passageiros que partiria do Porto de Genova, distante 360km de sua
amada Citadella, em direção ao Brasil, mais precisamente o Porto de
Santos. Maria estava eufórica com aquela aventura e jamais tendo visto o mar,
se encantou com tamanha imensidão quando no colo de seu pai, avistou-o pela
primeira vez. A viagem no navio à vapor podia durar 40 dias e quase todos os
viajantes não tinham ainda destino certo de trabalho. Tão somente sabiam que
iam para o Brasil: “As condições de
viagem na terceira classe eram muito difíceis. Era uma condição de pobreza,
muitas pessoas e pouca comida. Porém, tinha pessoas que sonhavam, que cantavam.
O clima de esperança ajudava muito a enfrentar a viagem e as dificuldades,
doenças”, conta o presidente da Autoridade Portuária de Gênova, Luigi
Merlo. Somente quando chegavam aos portos brasileiros as famílias descobriam
para qual região do país seriam levadas. O fato é que havia corporações que
distribuía esses imigrantes entre várias fazendas do Estado de São Paulo, que
faziam suas solicitações na busca desses empregados. A chegada ao Brasil
ocorria no porto de Santos e também no do Rio de Janeiro. Outros podiam até ir
em direção ao sul. Giuseppe desembarcou em Santos exatamente no dia
09/11/1891 dando assim adeus ao Vapor Solferino e firmemente segurando sua
filha pelas mãos, aguardou pacientemente sua vez que fazer o registro de
entrada no país e em seguida foi enviado para a Hospedaria do Imigrante onde
descansou por dois dias. Teve
sorte e foi direcionado para um grupo que seria alocado no interior de São
Paulo, na região de Olímpia. É preciso entender que o Brasil
recentemente havia abolido a escravidão e carecia urgentemente de mão de obra e
por este motivo o governo incentivava a imigração e até pagava as passagens dos
estrangeiros. Não tinham muito escolha onde iriam trabalhar, sequer quais
seriam seus rendimentos se adequados ou não. O que mais importava,
era ter trabalho, ter um teto para se abrigar e ter condições de se alimentar. O
futuro daria a resposta daquela empreitada carregada de aventura. O trabalho foi
duríssimo e Giuseppe com o tempo acabou encontrando no Brasil uma nova
companheira com quem veio a se casar. A felizarda que conquistou o coração
deste jovem italiano foi Catarina Sartori, também italiana, que acabou criando
Maria como verdadeira e adorada filha. Deste novo casamento,
Giuseppe com Catarina, vieram ao mundo três novos filhos: Silvio
Pegoraro; Angelin Pegoraro e Tilio Pegoraro. Maria passou
a ter três...não quatro guardiões contando com o pai. Mas isso não
foi impedimento quando ainda jovem Maria alegrasse os olhos de José Pauloski e
conquistasse de pronto o seu coração. Foi amor arrebatador, à primeira vista. Jovem,
claro e de olhos amendoados não houve como resistir ao charme deste polonês.
Imigrante também, apaixonou-se perdidamente por aquela italianinha bem formada
e com os olhos quase verdes das terras da Itália. O maior problema de José
Pauloski foi quando resolveu pedir a mão de Maria para Giuseppe, cercado pelo
trio de irmãos que os olhavam desconfiado. Mas, José embora tímido, não
tinha nada a perder e criou coragem quando uma certa manhã bateu à porta de seu
futuro sogro e se apresentou, dizendo desde logo que estava apaixonado por
Maria, era um trabalhador conhecido, com boa intenção. Catarina,
disfarçadamente deu um chute na canela de Giuseppe antes mesmo deste abrir a
boca. Surpreso, olhou enviesado para a mulher mas convidou o
visitante para entrar e ainda ofereceu-lhe café. Maria não apareceu ficando no
quarto, mas colando os ouvidos na porta. Quando percebeu que todos
estavam rindo, suspirou, pois, sabia que o namoro havia sido aceito. O
casamento se realizou, e os irmãos passaram a frequentar a casa de Maria
e José em Cosmópolis. O casamento foi longo e feliz e desta união vindo
Natalino, o avô de Nelsi Strasser que hoje faz parte do nosso grupo. Viveram
na Itapira e no final da vida na cidade de Santo Antonio de Posse, onde morreram.
Giuseppe também residia em Itapira na fazenda e com seus filhos dava um duro
danado com enxada e colheita a mão. Certo dia, Silvio
também conheceu uma Maria. As Marias estavam vida desta família. Esta
era Maria Brunheira, com quem se casou. Desta
união tiveram vários filhos: Clarindo, Dorival, Ormelindo, Ademar,
Wanderley, José, Luiz, Alzira, Arlete e Sylvio Jr. Meu
pai, Dorival Pegoraro, falecido me pediu certa vez para leva-lo
até suas origens no interior de São Paulo, operação que acabei ficando-lhe
devendo. Mas, a história de Giuseppe é digna de ser contada, ainda
que de forma simples e resumida como esta. Partiu da Itália com 24
anos e uma filha de dois, sendo viúvo. Imaginem o trabalho com esta
criança nos porões da 3ª Classe daquele vapor. Quarenta e cinco dias,
provavelmente sem um banho adequado e alimentação sadia. Sobreviver a jornada
já foi um ato heroico. Trabalhar, num país estranho, gerar filhos e hoje na
quarta e quinta geração, poder ser lembrado é o mínimo que podemos fazer a este
herói. A família Pegoraro e a família Pauloski tem muito; muito
mesmo em comum. É uma pena que não tenhamos mais contato com esses nossos
parentes. Quem sabe alguns voluntários não se apresentam para
fazermos uma visita a Nelsi que abriu as informações da sua bisa Maria
Pauloski. A pequena menina de dois anos que imigrou da Itália para o
Brasil, pouco falando de sua própria língua de origem. Me sinto realizado em
poder escrever aqui a pequena história de Giuseppe. Agradeço ao
Bruno Pegoraro, meu filho que forneceu parte dos documentos que possibilitaram
esta pesquisa. Bruno já é Italiano graças a Giuseppe, com passaporte
e tudo. E ao que consta é o único italiano de todas essas gerações de Pegoraro,
exceto Giuseppe. A Nelsi que também colaborou com as informações. Podemos
sempre melhorar esta história com outros detalhes que queiram acrescentar nos
comentários. Esta já é a 1ª revisão do
texto originário. Obrigado.