MORDIDA NA CRECHE NÃO GERA INDENIZAÇÃO
(Ivan
Pegoraro)
A criança ao ser matriculada
na creche ou na escola regular tem como objetivo aprender e se socializar. Desde
tenra idade passa então a conviver com todos os aspectos da sociedade, não só
tendo contato como os adultos seus professores, como também com seus iguais,
coleguinhas que ali estão consigo durante várias horas do dia. A personalidade
vai se moldando desde cedo e reações de alegria, tristeza e até a agressividade
devem ser recepcionadas com a naturalidade que merece. Os pais ao confiarem
seus filhos a entidade espera o melhor, mas não se pode é acreditar piamente
que situações não esperada possam deixar de acontecer como pequenas desavenças
entre os infantes. Numa determinada
creche do Estado do Rio de Janeiro uma criança de dois anos mordeu o braço da
outra da mesma idade. Aquilo que teria de ser recebido como uma situação
absolutamente normal, teve uma reação desproporcional por parte da família da criança mordida. A família se escandalizou.
Foi o fim do mundo. Foi o suficiente para a judicialização do caso, ingressando
os pais com ação de indenização contra a escola e os pais da criança que mordeu
pleiteando danos morais de vinte mil reais. Os pais se transforam em figuras raivosas
e o filho em mártir do sistema educacional.
Onde já se viu, o filho ser mordido por outra criança da mesma idade ! Proposta a ação após a devida instrução, ficou
realmente comprovado que a ocorrência se limitou a mordida da criança de dois
anos. Nada mais grave do que isso. A
ação foi julgada improcedente e teve a juíza a clareza de afirmar que realmente
houve nos autos prova da ocorrência, mas nada que tivesse extrapolado o
absolutamente rotineiro, normal e comum ao dia a dia de crianças de dois anos
de idade e que convivem juntas em uma creche, disputando brinquedos e até
espaços. Disse ela em sua sentença “Crianças dessa idade frequentemente adotam
comportamentos que seriam inadmissíveis para crianças mais velhas ou adultos.
Choram quando contrariadas, emburram, batem, gritam. E mordem”. No texto constou ainda que nos registros da
creche consta que este tipo de ocorrência é bastante comum já que em várias oportunidades,
comunicou aos responsáveis que o menino havia sido mordido pelo colega
“agressor” depois de bater, arranhar ou morder o outro. Completou ainda a juíza,
“De fato, dói no coração da mãe receber o bebê no fim do dia com uma marca de
mordida no seu bracinho. Certamente, a mãe da outra criança também sofreu ao
ser informada de que o autor havida batido, ou arranhado, ou mordido seu filho.
Mas o sofrimento faz parte do crescimento. Já diz o ditado, ser mãe é padecer
no paraíso”. A reação dos pais
caracteriza uma infantilização e desse modo assoberbam o Poder Judiciário com
ações infundadas, onde o âmago delas é unicamente o inconformismo com a infelicidade.
Em outras palavras não pode haver incidentes com seu filho pequeno que deve
crescer e ficar adulto sem ter a experiência do revés. E se tiver, a Justiça deve se
pronunciar. Deve se pronunciar porque
este filho a ser criado na redoma da proteção total deve ter direito à
felicidade absoluta e como se o magistrado que ali está para apaziguar os
abusos e desrespeito ao direito tivesse o poder de garantir a felicidade
permanente e irrestrita a todas as pessoas que batem a sua posse. Segundo a
juíza, adultos cada vez mais infantilizados assoberbam o Poder Judiciário com
ações infundadas, cujo cerne é nada mais que um inconformismo com a
infelicidade. Como se existisse um direito absoluto à felicidade e como se o
juiz tivesse o poder de garantir essa felicidade permanente e irrestrita a
todas as pessoas. Concluiu a juíza negando a indenização o seguinte: “Deste
modo, a única resposta que o Estado Juiz tem a dar para o Autor e sua genitora
é que a vida, e a infância, e a maternidade, são feitas de momentos bons e
maus, felizes e tristes, alegrias e aborrecimentos, expectativas frustradas e
superadas. Faz parte do crescer. Faz parte do maternal. E, por fim, se não se
tem confiança na escola escolhida para o filho, o melhor caminho é escolher
outra em que se consiga estabelecer esse sentimento tão importante.” A rotina do cotidiano faz parte da formação.
Talvez todo aquele sentimento de ódio carregado pelos pais do menino mordido,
toda a indignação e inconformismo tenha feito muito mais mal ao pequeno do que
o bem material poderia fazê-lo se tivessem vencido a demanda. Os adultos devem se conter e acreditar que
nem todo mal, faz mal; com certeza no dia seguinte as duas crianças estavam
juntas, felizes enquanto os pais se corroíam de ódio e insensatez. E
transferindo este sentimento negativo ao seu filho que no dia seguinte, nem
mais se lembrava do episodio. (O processo tramitou em segredo de justiça numa
das varas da infância do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro).
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